Nesta semana dedicada à consciência negra, reproduzimos esta NJ Especial, publicada originalmente em 17/03/2017, que aborda a inserção da população negra no mercado de trabalho. Acompanhe!
Hoje em dia, a discriminação racial é tão comum que chega a ser invisível para quem não é vítima. Abolimos a escravidão física, os chicotes, troncos, grilhões e demais instrumentos de tortura, mas ainda mantemos viva na mente a escravidão do preconceito, repetida por séculos. As condutas racistas podem ser definidas como um sentimento de superioridade biológica, cultural, moral de determinada raça, povo ou grupo social considerado como raça. São manifestações da crença na existência de raças humanas distintas e superiores umas às outras.
Essa convicção foi utilizada no passado para justificar a escravidão, o domínio de alguns povos sobre outros, os genocídios e um dos maiores crimes contra a humanidade: o nazismo. Mas, mesmo em pleno século XXI, com tantas leis criminalizando condutas racistas, engana-se quem pensa que não ocorrem atos discriminatórios e preconceituosos, ainda que velados. E as principais vítimas são mesmo pessoas da raça negra.
Diante das novas legislações e políticas afirmativas, as empresas hoje têm buscado aplicar métodos e estratégias para o combate à discriminação e ao racismo, proibindo condutas discriminatórias, assédio e todas as formas de opressão exercidas sobre empregados com base em diferenças raciais. Mas, ainda existem aqueles empregadores indiferentes a essa nova mentalidade, que demonstram preconceito em relação ao trabalhador negro. Isso pode ser verificado pela grande incidência de processos na Justiça do Trabalho mineira que denunciam a prática de racismo e de injúria racial no ambiente de trabalho.
Qual é a diferença entre racismo e injúria racial? Em que casos esses dois atos discriminatórios podem ser identificados? Como a Justiça do Trabalho mineira tem se posicionado em relação às ações recebidas que abordam a questão da discriminação racial? Esse tema atual e preocupante, que ainda é recorrente no moderno mercado de trabalho, será enfocado nesta NJ Especial, na qual acompanharemos o julgamento de casos marcantes. Mas, antes disso, vamos examinar rapidamente a legislação que rege a matéria.
Legislação aplicável à matéria
As leis brasileiras e as normas internacionais proíbem ao empregador e a qualquer pessoa a adoção de qualquer prática que implique preconceito ou discriminação em virtude de raça. Nesse sentido é a orientação expressa na Constituição Federal, artigo 3º, inciso IV e artigo 5º. A Convenção nº 111 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1958, ratificada pelo Brasil e promulgada pelo Decreto nº 62150, de 19.01.1968, estabelece a eliminação de toda discriminação em matéria de emprego, inclusive por motivos de raça. É importante destacar a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho, na qual se reafirmou o compromisso dos Estados-membros, dentre os quais figura o Brasil, de aplicar o princípio da não-discriminação em matéria de emprego e ocupação. Nesse sentido também a Lei nº 9.029, de 13/04/1995.
Racismo X injúria racial – A Constituição Federal de 1988 estabelece, no artigo 5º, que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. Já o inciso XLII do mesmo artigo dispõe que a prática do racismo é crime inafiançável e imprescritível. E não para por aí. Foi introduzido no Código Penal o parágrafo 3º ao artigo 140, que trata do crime de injúria, cuja pena é de detenção, de um a seis meses, ou multa. No entanto, se a injúria for praticada com referência à raça, cor, etnia, religião ou origem, a pena é agravada, passando à reclusão, de um a três anos e multa. E a Lei nº 7.716/89, alterada pela Lei nº 9.459/97, define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor.
O bem jurídico protegido pelo tipo injúria racial é a honra subjetiva. Nela, a ofensa se dirige à raça, cor, etnia, religião, origem ou à condição da pessoa com deficiência ou idosa (rol exemplificativo), tendo como vítima pessoa determinada. Exemplo: Chamar o trabalhador negro de “neguinho cabelo de vassoura, canarinho de coqueiro, brasa apagada e beiço de apagar goteira”, como ocorreu no caso relatado no processo PJe nº 0010950-12.2016.5.03.0095, ajuizado perante a Vara do Trabalho de Santa Luzia e julgado pelo juiz Antônio Carlos Rodrigues Filho. Nesse caso, a empregadora foi condenada ao pagamento de indenização por danos morais no valor de 5 mil reais, com responsabilidade subsidiária da empresa tomadora de serviços, que se beneficiou da mão de obra do empregado.
Por sua vez, o crime de racismo, previsto em lei especial, a Lei nº 7.716/89, visa a proteger a dignidade da pessoa humana. Na modalidade, a ofensa é dirigida à raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional (rol exemplificativo). Entretanto, o número de vítimas é indeterminado, uma vez que há verdadeira exclusão de indivíduos. Exemplo: Negar emprego a negros ou judeus em determinada fábrica.
Na 2ª Vara do Trabalho de Poços de Caldas, durante o julgamento do processo PJe nº 0010917-88.2015.5.03.0149, o juiz Renato de Sousa Resende trouxe a sua definição de injúria racial. De acordo com o magistrado: “A injúria racial trata-se, a rigor, de crime introduzido no artigo 140, § 3º do Código Penal pela lei 9.459/1997 no sentido de caracterizar como tipo penal próprio à ofensa, à dignidade e ao decoro com base na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião e origem. É usado, assim, o elemento referente à raça para atingir a honra subjetiva da vítima, com manifesta vontade de discriminar. Frequentemente, está associado ao uso de palavras depreciativas como meio de afrontar a honra subjetiva, mas pode também se expressar por meio de gestos ou outras condutas cujo contexto não deixe dúvida sobre a intenção da ofensa”.
Será que podemos considerar que uma pessoa praticou injúria racial toda vez que ela apelidar alguém de “negão”? Nem sempre, na visão do julgador. Ele advertiu que cada caso deve ser analisado com cuidado, pois nem todo apelido, gesto ou expressão popular pode ser enquadrado no conceito de injúria racial. Nesse sentido, ele ponderou que os termos e expressões devem ser interpretados dentro de um contexto, levando-se em consideração a intenção da pessoa que se manifestou através dessas palavras. “Não basta, contudo, chamar alguém de “negão” ou de “negro”, se de descendência afro-brasileira ou pela cor de sua pele, para, automaticamente, interpretar-se a conduta como injuriosa à honra. Embora haja, indubitavelmente, vários resquícios depreciativos à cor negra, utilizados indistintamente e até de modo inconsciente em nossa linguagem, como “não sou tuas negas”, “tinha que ser preto mesmo”, “amanhã é dia de branco”, “você tem um pé na cozinha ou na África”, “serviço de preto”, “denegrir a minha imagem” e “a coisa tá preta”, entre outros, o que há, obviamente, de ser corrigido por políticas culturais e educacionais sérias para varrer os vestígios do período escravagista e da discriminação, não se pode, de pronto, associar os termos “negro”, “negão” ou “negrão” com a prática de ofensa à honra”, completou.
No caso analisado pelo juiz, o coletor de lixo foi chamado pelo chefe de “negão” e não pelo seu nome próprio.
Entretanto, ao analisar o conjunto de provas, o julgador não caracterizou a conduta do chefe como crime de injúria racial. Conforme observou o magistrado, o coletor trabalhava com o chefe há apenas um dia e a testemunha sequer viu o empregado protestar contra o apelido, tendo apenas associado a dispensa sem justa causa àquilo que o trabalhador lhe contou.
Ao finalizar, o magistrado reiterou que, isoladamente, os termos podem representar intimidade, proximidade, amizade, aspectos positivos e não, rigorosamente, ser indicativo de discriminação e ataque. “Nesse sentido, não é incomum que traços ou características físicas redundem em apelidos não necessariamente ofensivos, por si só, se tomados desvirtuados do contexto e da intenção. Por exemplo, não é raro um homem de cabelos claros ser chamado de “Alemão” ou uma mulher de origem oriental ser tratada como “Japa”. Na realidade da Vara do Trabalho onde o Juiz prolator desta decisão exerce seu ofício, há um porteiro, de cor negra, casado com uma mulher de cor branca e a trata, carinhosamente, como “minha branquela” e nem por isso percebe-se intenção de maltratar ou a configuração de uma afronta. É possível ouvir também relatos de casais de cor branca que se tratam por “minha preta”, “meu preto”, com o mesmo intuito afetivo. Há homens de raça negra que se autointitulam de “negão”, exibindo inconteste orgulho da cor e da origem”,concluiu.
Candidatos negros são alvos de manifestação velada de racismo nos processos seletivos?
No dia 10/11/2016, o governo do estado do Paraná fez uma experiência envolvendo profissionais de RH, responsáveis pela seleção de novos candidatos a vagas de empregos. A experiência faz parte de uma campanha do governo paranaense, cujo intuito é avaliar o nível de ocorrência do racismo institucional.
Segundo o governo paranaense, o objetivo da campanha é fazer com que as pessoas percebam o quanto o racismo está enraizado no ambiente corporativo e como, muitas vezes, somos racistas sem perceber. De acordo com os dados disponibilizados no site que divulga a campanha, os negros são maioria entre os desempregados e 82,6% dos negros afirmam que a cor da pele influencia na vida profissional. Nesse contexto, foi apurado que, mesmo quando empregados, os negros são discriminados: ganham 36% menos do que pessoas brancas e ocupam apenas 18% dos cargos de liderança no Brasil.
O governo do Paraná ressaltou que o “Teste de Imagem” é um experimento real. Participaram dele profissionais reais de recursos humanos, que foram divididos em dois grupos distintos e emitiram opiniões espontâneas às imagens apresentadas pelo mediador do experimento. Os dois grupos foram reunidos em uma sala e convidados a dar opinião a respeito das fotos. Eram imagens de homens e mulheres em situações cotidianas: correndo na rua, segurando uma peça de roupa, cortando uma planta com um tesourão de jardinagem, entre outras atividades rotineiras.
Um grupo viu as fotos com pessoas brancas nas situações mencionadas e julgou ver um homem apressado, uma mulher escolhendo uma roupa para comprar e um rapaz cuidando do próprio jardim. Outro grupo viu as mesmas fotos, mas com pessoas negras e julgou ver um homem fugindo, uma mulher vendendo roupas e um jardineiro profissional.
Ficou clara no vídeo a diferença de pontos de vista dos profissionais participantes do experimento em relação à cor de pele. Quando as fotos eram de pessoas brancas, os participantes do teste diziam que eram esportistas, ou ocupantes de cargos de liderança, bem remunerados, ou consumidores fazendo compras e praticando um hobby. Quando as fotos eram de pessoas de pele negra, eles diziam que eram trabalhadores com baixa remuneração, desempregados ou “ladrões” fugindo.
Até o momento, o vídeo da campanha foi visto mais de um milhão de vezes e gerou comentários de apoio e de protesto. Sem a intenção de abordar o ponto central da discussão, foi apresentada apenas uma situação como exemplo do que seria o racismo. Para diferenciá-lo do conceito de injúria racial, veremos a seguir outros casos que tratam desse tema, julgados na Justiça do Trabalho mineira.
JT aumenta para R$10 mil indenização que supermercado terá que pagar por injúria racial
No julgamento realizado na 11ª Turma do TRT mineiro, a desembargadora Adriana Goulart de Sena Orsini decidiu aumentar para 10 mil reais o valor da indenização a ser paga por um supermercado ao empregado, vítima de injúria racial. Atuando como redatora do recurso do supermercado, a magistrada entendeu que havia provas consistentes do assédio moral, em razão das ofensas de cunho racial que o chefe dirigiu ao trabalhador.
Na primeira instância, a juíza sentenciante condenou o supermercado ao pagamento de uma indenização por danos morais, fixada em 7 mil reais. Para ela, foi demonstrado que o chefe do trabalhador, na prática do vil preconceito racial, vivia fazendo piadas de mau gosto e usando expressões discriminatórias, com o intuito de depreciar e diminuir o valor social da pessoa de pele negra, como se o comportamento ético pudesse ser avaliado a partir da cor do ser humano e não pela sua própria conduta.
Nessa mesma linha de entendimento, a desembargadora redatora do voto vencedor na Turma concluiu que osdepoimentos das testemunhas foram suficientes para caracterizar o dano moral experimentado pelo trabalhador. Ela destacou o relato de algumas “piadinhas” que partiam do chefe e eram dirigidas exclusivamente ao trabalhador. Segundo a testemunha, o chefe dizia que “quem gostava de urubu era vaqueiro de fazenda”, “que tomou raiva de preto depois que o urubu comeu o seu cachorro”, e que também contava estória de três urubus “onde a moral da história era que preto rico não se mistura com pobre”.
De acordo com a testemunha, esses comentários só surgiam quando o trabalhador estava por perto, sendo que o chefe ainda costumava chamá-lo de “negão” e “macaco”. Isso acontecia com frequência e a vítima não reagia de imediato, mas a feição do seu rosto mudava, segundo declarações da testemunha. Ela relatou ainda que, depois de certo tempo, houve uma desavença entre eles por causa dessas atitudes do chefe. Tudo foi confirmado por outra testemunha, que acrescentou as “brincadeiras” eram feitas na frente dos clientes, que perguntavam se o empregado não iria se defender, mas ele achava melhor “deixar pra lá”. Mais duas testemunhas, indicadas pelo supermercado, apresentaram depoimentos em sentido contrário. Ou seja, afirmaram que o ambiente de trabalho era saudável e que nunca presenciaram racismo na empresa.
A desembargadora considerou mais convincentes as declarações das duas primeiras testemunhas, confirmando que o chefe costumava dirigir ao repositor comentários e piadas de cunho racista. Na percepção da julgadora, as testemunhas indicadas pela empresa apenas não presenciaram os fatos, o que não compromete a validade da versão apresentada nos primeiros depoimentos. “Ambas as testemunhas apresentadas pelo autor presenciaram tais incidentes, mais de uma vez, confirmando, portanto, o tratamento ofensivo”, completou.
Diante da reiteração da conduta praticada por um preposto da empresa, a magistrada entendeu comprovada a prática de injúria racial contra o empregado. “Destaca-se, ainda, que compete à reclamada zelar pelo meio ambiente de trabalho, proporcionando um ambiente livre de agressões morais e injúrias. E, considerando o porte da reclamada e a gravidade da conduta, inclusive tipificada pelo Código Penal como crime, elevo o dano moral fixado na origem para R$10.000,00”, concluiu a redatora do voto, cujo entendimento foi acompanhado pela maioria da Turma julgadora. (PJe: Processo nº 0010630-40.2015.5.03.0145-RO).
Auxiliar de cozinha é vítima de injúria racial por ser judeu e negro
Na 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, o juiz André Barbieri Aidar condenou uma empresa de comércio de alimentos ao pagamento de uma indenização, no valor de R$17.500,00 a um empregado vítima de injúria racial. Ao julgar o recurso da empresa, a 2ª Turma do TRT mineiro decidiu reduzir o valor da indenização por danos morais para R$5 mil. Isso porque, na visão do desembargador Jales Valadão Cardoso, relator do recurso, ficou dividida a prova testemunhal relativa às ofensas que teriam sido dirigidas ao trabalhador pelos sócios da empresa.
Pelo que foi apurado no processo, dois sócios da empregadora faziam comentários ofensivos e preconceituosos, dirigidos ao auxiliar de cozinha, somente pelo fato de ser ele judeu e negro. Na análise da prova testemunhal, concluíram os julgadores, tanto na primeira quanto em segunda instância, que realmente ficaram comprovados os fatos noticiados na petição inicial, os quais demonstram o tratamento discriminatório praticado pelos sócios. O juiz sentenciante acrescentou que, embora os ofensores não fossem empregados da empresa, atuaram como verdadeiros prepostos, inclusive com poderes de mando.
“Dessa forma, nos termos do art. 932, III, do CCB, o empregador responde pela reparação civil no caso de danos causados por seus empregados e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele, sobretudo porque era seu dever propiciar aos empregados ambiente de trabalho sadio e manter constante vigilância sobre seus subordinados, a fim de prevenir situações como as descritas”, enfatizou o juiz ao condenar a empresa ao pagamento da indenização. (PJe: Processo nº 0011568-03.2016.5.03.0112-RO).
Empresa deverá pagar indenização a ex-empregado que sofreu injúria racial no trabalho
Um vendedor conseguiu na Justiça do Trabalho indenização por danos morais, no valor de 34 mil reais, por ter sofrido injúria racial no trabalho. Ele narrou uma série de episódios, nos quais foi humilhado no ambiente de trabalho, em razão da cor de sua pele. As alegações foram confirmadas por uma testemunha, que contou que, ao ser aprovado no vestibular de Direito, recebeu fotos de chimpanzés de terno e gravata. Não bastasse, um papel de bala “Chita” foi colado no cartão de visitas da loja que continha o nome do vendedor.
Diante desses fatos, a 3ª Turma do TRT mineiro entendeu clara a existência de conduta discriminatória por parte dos empregados, com o conhecimento do empregador. A prova testemunhal demonstrou que o trabalhador sofreu discriminação racial durante oito meses, com o amplo conhecimento do empregador, sem que fosse tomada qualquer providência para frear a repudiada conduta dos colegas de trabalho do vendedor.
Para o desembargador Manoel Barbosa da Silva, relator do recurso da empresa, os fatos chegam a ser chocantes e muito graves, porque demonstram o desrespeito ao próximo, que tem imperado em nossa sociedade, mas precisa ser rechaçado. Ele frisou que “o respeito à dignidade do ser humano ultrapassa os limites da relação de emprego para aderir a todo cidadão, independente de casta, origem, raça, nacionalidade ou credo religioso”, conforme consta da Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948, cujo Artigo XII prevê que “ninguém será sujeito à interferência na sua vida privada, na sua família, no seu lar ou na sua correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Todo homem tem direito à proteção da lei contra tais interferências e ataques”.
O relator fundamentou seu voto no inciso III do artigo 932 do Código Civil, pelo qual também são responsáveis pela reparação civil, “o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”. E, para o juiz convocado, ficou evidente, no caso, a prática de ato ilícito pelo empregador, através de seus prepostos, havendo clara ofensa à honra do empregado, tendo em vista o tratamento desrespeitoso, humilhante e preconceituoso que sofreu, de forma constante. Situação essa mais do que suficiente para justificar o pagamento de indenização por danos morais, pois, segundo frisou o relator, “o menosprezo ao subordinado é causa bastante para levar ao sofrimento íntimo de quem tem dignidade”, concluiu, negando provimento ao recurso da empresa. (0001271-21.2014.5.03.0139-RO).
Empresa indenizará empregado atacado com mensagens de cunho racista no e-mail funcional
Em outro caso, a 3ª Turma do TRT-MG confirmou a sentença que deferiu indenização por danos morais, no valor de R$7.500,00, a trabalhador vítima de racismo no ambiente de trabalho. Ficou comprovado que o chefe usava o e-mail funcional para difundir entre colegas mensagens contendo referências discriminatórias ao trabalhador, em razão da cor de sua pele. Nas mensagens eletrônicas, o trabalhador foi comparado a chimpanzés e sacos de carvão, o que, na avaliação dos julgadores, caracteriza injúria racial.
A empresa admitiu que, à época dos fatos, não mantinha qualquer política de controle do uso do e-mail funcional, passando a exercer esse controle somente após o episódio. Em seu voto, o desembargador relator, Luís Felipe Lopes Boson, frisou que a empresa tinha a obrigação de fiscalizar o ambiente de trabalho, coibindo práticas como essas.
O fato de o empregado não ter comunicado as ofensas à administração foi considerado justificável pelo magistrado. Isso porque ele sofreu ameaça de ser dispensado, justamente por parte do ofensor. Para o relator, o temor de sofrer represálias, caso denunciasse o fato, era legítimo.
O desembargador também não acolheu o argumento da ré de que de que as agressões teriam sido recíprocas entre os empregados. Ele destacou que o trabalhador apenas retaliou as ofensas recebidas. Para o julgador, não há como comparar as mensagens partidas dele com as dirigidas pelo ofensor, de conteúdo racista. Na decisão, foi apontado que esta conduta é repudiada pelo ordenamento brasileiro em diversas leis e, principalmente, na Constituição Federal.
A responsabilização objetiva da ré, nos termos do artigo 932, inciso III do Código Civil, foi aplicada ao caso. O dispositivo responsabiliza o empregador, por atos praticados por empregados em serviço, pela reparação civil. Por unanimidade, a Turma de julgadores negou provimento ao recurso da ré. Também o recurso do trabalhador foi rejeitado, por entenderem os julgadores que a quantia fixada em 1º grau para a indenização se mostra adequada à finalidade pretendida. (0001111-41.2013.5.03.0006-RO).
Empresas indenizarão motoboy apelidado de mascote do Flamengo
O juiz José Nilton Ferreira Pandelot, titular da 1ª Vara do Trabalho de Juiz de Fora, deparou-se com um caso de injúria racial ao julgar a ação ajuizada por um motoboy contra a Potenay Ltda. e a Drogaria Pacheco S/A. Em sua análise, o magistrado constatou que o motoboy foi vítima de tratamento preconceituoso por parte de prepostos da drogaria, que o discriminavam em razão da cor de sua pele, dirigindo-lhe palavras e expressões de cunho racista, como “macaco”, “nego fedido” e “mascote do Flamengo”, que é o urubu. “A ofensa atinge a personalidade do autor, o que ele é e sua origem racial, abalando profundamente sua dignidade como ser humano e sua posição sócio-política como representante da raça negra no contexto da sociedade juizforana”, enfatizou o julgador.
O motoboy relatou que foi contratado pela empresa prestadora de serviços para trabalhar com entregas de medicamentos da drogaria e, apesar de integrar mão de obra terceirizada, a atividade desenvolvida por ele demandava contato direto e contínuo com os empregados da tomadora de serviços, os quais insistiam em insultá-lo com apelidos racistas. Em sua defesa, a empregadora sustentou que não existiu qualquer intenção de ofender ou menosprezar o motoboy, já que essas expressões eram ditas em tom de brincadeira. Na visão do julgador, a drogaria, que sequer contestou as alegações do motoboy, demonstrou grave omissão por não adotar os cuidados necessários para garantir um ambiente de trabalho saudável, e disso resulta a sua culpa.
O juiz frisou que a empresa terceirizada também não tomou providências, nem intercedeu em favor de seu empregado, descumprindo o dever de proteção àquele que lhe presta o serviço. A empresa ainda tentou convencer o julgador de tudo não passou de simples brincadeiras inofensivas, resultantes da natural rivalidade e implicância entre times concorrentes, quando uns chamam os outros pelos nomes dos mascotes não oficiais. Porém, o magistrado entendeu que não foi esse o caso do processo, pois não havia ambiente desportivo nem discussão sobre futebol. “A relação entre o autor e seus detratores era a decorrente do contrato de emprego, no âmbito do estabelecimento empresarial, onde deveria imperar o respeito mútuo e a proteção à integridade física e moral do trabalhador”, completou.
Diante desse quadro, as empresas foram condenadas, de forma solidária, ao pagamento de uma indenização por danos morais, fixada em R$30.940,00. O TRT de Minas manteve a condenação, apenas reduzindo o valor da indenização para R$15.000,00. (Processo nº 0001090-80.2010.5.03.0035).
Apelidos racistas no ambiente de trabalho geram danos morais
O juiz Márcio José Zebende, titular da 1ª Vara do Trabalho de João Monlevade, julgou uma ação proposta por um pedreiro, vítima de discriminação racial na construtora onde ele trabalhava.Conforme relatou o pedreiro, o mestre de obra se referia a ele como “macaco”, “chimpanzé”, “pau de fumo” e “urubu”, na presença de outras pessoas. As testemunhas ouvidas declararam que o mestre de obra nunca chamou o reclamante pelo nome, sempre se dirigindo ao mesmo por xingamentos humilhantes e apelidos racistas. De acordo com os depoimentos, os que ouviam as brincadeiras riam do pedreiro.
Na avaliação do julgador, a conduta patronal mostrou-se desrespeitosa e desumana, acarretando ao empregado abalo psicológico e constrangimentos, o que merece a devida reparação. “Com efeito, as ofensas verbais dirigidas ao empregado, reveladoras do preconceito racial, constituem a prática de ato discriminatório, por causarem lesão à honra, à imagem e à dignidade da pessoa, ensejando, por essa razão, a reparação por danos morais”, finalizou o juiz sentenciante, condenando a construtora ao pagamento de uma indenização por danos morais, fixada em R$3.000,00. (Processo nº 00779-2009-064-03-00-2).
Fonte: NJ Notícias Jurídicas – TRT MG